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Processo de Desafetação de Áreas Públicas – posicionamento de professores da área de desenvolvimento urbano e regional do IESA

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Posicionamento dos professores da área de planejamento urbano e regional do Instituto de Estudos Socioambientais (IESA), da Universidade Federal de Goiás, em relação ao Projeto de Lei Complementar, número 50, que desafeta áreas públicas municipais de Goiânia

No momento em que várias cidades do planeta lutam para afirmar a função social da propriedade, o Governo Municipal simplesmente abre mão de um dos principais insumos de ordenamento espaço urbano que é, justamente, a possibilidade de manejar estoques de terras para interesses coletivos. A leitura da justificativa do Projeto de Lei número 50, enviada para a Câmara Municipal em 11/12/2013, causa desconforto. Escreve o Prefeito: “Ademais, a presente proposta trata da desafetação de áreas que se encontram subutilizadas, estando passíveis, em tese, de alienação e de adensamento. Importante salientar que algumas são áreas cujas destinações relacionam-se a órgãos da Administração Pública Municipal, os quais se manifestaram favoráveis às desafetações em apreço, haja vista que não há previsão de utilização pelos mesmos, não implicando em prejuízo para a população” (grifo nosso, p.8 de 306).

Três apontamentos, antes de uma análise mais detalhada do PL-50, são necessários.  O primeiro é que as áreas não estão subutilizadas. Área pública, por definição, não é subutilizada. A disposição do Prefeito para subutilizar áreas deveria ser mirada nos mais de 100.000 lotes vagos do perímetro urbano. O segundo apontamento refere-se ao adensamento. O adensamento não deve ser justificativa para venda e/ou permuta de áreas públicas, uma vez que aumentará as demandas por investimentos públicos nas áreas desafetadas. O terceiro apontamento guarda relação com a manifestação favorável dos órgãos do Executivo Municipal. Seria ingenuidade supor que o secretariado municipal manifestasse uma opinião divergente daquela decretada pelo Paço Municipal. Em ofício enviado no dia 15/10/2013, sobre duas áreas com dimensão total de 10.849,84 m2, no Setor Universitário (destinação primitiva para sede da SME) e no Residencial Humaitá (destinação primitiva para CMEI), consta a seguinte resposta da então secretaria Neyde Aparecida da Silva para o Gabinete do Prefeito: “… informamos que a SME não tem projetos definidos para as áreas em questão, de modo que não há interesse na utilização desses espaços por esta Pasta” (p.234 de 306). Interessante que no PL-50, no artigo que trata da finalidade dos recursos, consta a construção da sede da SME no Parque Lozandes. Que melhor lugar para sediar a SME que o Setor Leste Universitário? Como não existe demanda, agora, ou no futuro, para construção de um CMEI na Região Norte de Goiânia?

Para além dos três apontamentos, podemos sistematizar algumas ressalvas sobre o PL-50:

A primeira ressalva resulta da relação entre a política urbana municipal e a política de desafetação de áreas públicas municipais. A vinculação entre as duas políticas, cujo foco da segunda resulta na possibilidade de financiamento da primeira, revela a incapacidade do Governo Municipal em pensar uma política urbana comprometida com o futuro. O atraso esta em compreender que a venda de ativos públicos constitui um meio eficaz de financiamento da política urbana.

A segunda ressalva resulta da amplitude PL-50, com foco em 18 áreas públicas municipais localizadas em distintos pontos da cidade. A dimensão das áreas pode variar de 35.999,86 m2 (Portal do Sol) a 1.957,19 m2 (Jardim Colorado Sul), somando um total de 208.421,3 mil m2. Essa estratégia política deixa pouco espaço para discussão, uma vez as estratégias pontuais, a exemplo da desafetação das áreas localizadas no Parque Lozandes e no Residencial Humaitá, são dissolvidas em uma discussão global que tem por objetivo angariar maior apoio político dos segmentos corporativos da cidade.

A terceira ressalva resulta da compreensão da natureza de uma política urbana que torna imprescindível a preservação dos estoques de áreas públicas. É, no mínimo, irônico que se venda áreas públicas em uma cidade cuja expansão horizontal gera demandas cotidianas por investimentos públicos em equipamentos de consumo coletivo. O parágrafo 3 do Art.2, do PL 50, descreve, laconicamente, a destinação dos recursos. Entre as 12 destinações descritas são apontadas, por exemplo, a construção de um viaduto na Avenida PL-2 com a BR-153, no Park Lozandes, justamente a área que será adensada pela desafetação. A equação é simples: o Governo Municipal dotou de valor imobiliário aquela área com investimentos públicos. O mesmo Governo Municipal pretende vender as áreas.  Em seguida, utilizando-se dos recursos da venda, o Governo Municipal dotará as mesmas áreas de amenidades ambientais e sistemas de mobilidade. A valorização imobiliária para os grupos corporativos será fiada com os recursos da coletividade.

 

Enfim, para além dos interesses partidários e corporativos e do epíteto de Goiânia Sustentável, temos a obrigação histórica de reafirmar nosso compromisso com o futuro da cidade, o que significa, nesse momento, negar com veemência o Projeto de Lei Número 50.

 

Goiânia, IESA, UFG, 10 de abril de 2014

 

 

Texto escrito por Tadeu Alencar Arrais

Originalmente publicado em IESA - UFG